15 de fev. de 2009

A ORIGEM MEDIEVAL DO TROTE UNIVERSITÁRIO

Foto: Veja.com

Encerrada a temporada de vestibulares, as universidades brasileiras recebem nesta semana milhares de novos alunos. É a abertura da temporada de matrículas, aulas e trotes - uma das mais controversas tradições do ensino superior brasileiro. Nos últimos anos, os trotes a alunos novatos têm chamado mais a atenção devido aos excessos: o caso exemplar de exagero foi o episódio que levou à morte, há exatos dez anos, Edison Tsung Chi Hsueh, que ingressava na prestigiosa Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Na manhã seguinte ao churrasco de recepção aos calouros, o corpo do estudante foi encontrado no fundo da piscina da associação atlética da faculdade. A tradição, porém, não cessou.
A cada temporada de matrículas, o trote volta a preocupar. Mas ele é também uma forma de inserir os calouros na nova fase, algo que os antropólogos costumam chamar de "ritual de passagem". Trata-se de uma tradição medieval - no sentido temporal da palavra. Sim, a prática do trote persiste desde a Idade Média.
Segundo Antonio Zuin, professor do departamento de Educação da Universidade Federal de São Calos (UFSCar), os candidatos aos cursos das primeiras universidades europeias não podiam frequentar as mesmas salas que os veteranos e, portanto, assistiam às aulas a partir dos "vestíbulos" - local em que eram guardadas as vestimentas dos alunos. "As roupas dos novatos eram retiradas e queimadas, e seus cabelos, raspados. Essas atividades eram justificadas sobretudo pela necessidade de aplicação de medidas profiláticas contra a propagação de doenças", explica Zuin, que é também autor do livro O Trote na Universidade: Passagens de um Rito de Iniciação.

Mais intrigante é a origem do termo "trote": é uma alusão à forma pela qual os cavalos se movimentam entre a marcha lenta e o galope. A aplicação da palavra ao mundo das relações entre calouro e veterano tem, na visão de Zuin, um significado claramente negativo. É como se o primeiro devesse ser "domesticado" pelo segundo "por meio de práticas vexatórias e dolorosas, que têm a função de esclarecer quais são as características das respectivas identidades". Paulo Denisar Fraga, filósofo e professor da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), ilumina outro termo do "vocabulário do calouro": "bixo", que no contexto do ingresso na universidade é utilizado para designar os novos alunos. "É um trocadilho desumanizador, em que a letra 'x' indica, depois do vestibular, aquele que está marcado".
Por Marina Dias

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